é possível aceitar as diferenças do “outro”? por que sim/não?
abril 28, 2010 às 12:27 | Publicado em Uncategorized | Deixe um comentárioTags: diferença, educação, multiculturalismo, racismo
Você é tolerante? Educação é a resposta para se entender o outro
Eloy Vieira / Luiz Amaro
comunica@ufs.br
Uma pergunta: você é tolerante? Pense um pouco e responda. Não precisa pressa. Oferecemos o tempo que achar necessário para refletir sobre seus atos e encontrar uma resposta. Mas, para não desgastá-lo muito, damos uma colher de chá. Segundo o professor Saulo Henrique, do Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Sergipe, ao pé da letra a palavra tolerância, que vem do latim ‘tolerare’, significa “sofrer, suportar, aceitar uma opinião que vai de encontro às suas crenças pessoais”, o que implicaria dizer que tudo seria aceitável. Mas a questão não é assim tão simples. Há um limite para se tolerar. “Não se deve tolerar aquele que não tolera. A tolerância deve ser um princípio difundido na sociedade, na política e na religião, mas tem que haver um limite”, diz o professor. Ainda segundo ele, crimes ou atitudes que contrariem o bem-estar da sociedade civil devem ser repreendidos, inclusive pelo Estado.
Hoje em dia, ainda de acordo com o professor, a questão da tolerância está bastante ligada ao liberalismo e à democracia, pois o Estado não tem mais o poder de intervir na vida privada como tinha séculos atrás. “A tolerância não existiria hoje se não fosse a liberdade proporcionada pelo liberalismo”, afirma, mas alerta que a democracia tem dois lados. “Ela permite uma tolerância, mas muitas vezes a democracia não tolera, pois a maioria acaba restringindo o indivíduo. Além disso, muitas vezes permite exclusões como no caso de pobres, negros, homossexuais etc.”.
‘Surgimento’ da tolerância
Depois de diversas guerras religiosas na Europa da Reforma Protestante do século XVI, a tolerância surge como uma necessidade pacificadora, como um meio de se conviver com o desmembramento que o Cristianismo assistia. Mas, só no século seguinte passa a ser objeto de estudo e alvo de vários tratados filosóficos confeccionados por estudiosos como o holandês Henri Basnage de Beauval, o inglês John Locke e o francês Pierre Bayle.
A professora aposentada da UFS Vahideh Jalali, que saiu do Irã década atrás, diz que até hoje a intolerância religiosa em seu país ainda é muito forte contra a sua fé, a Fé Bahá’í, que surgiu em território iraniano há pouco mais de 160 anos. “Eu saí do Irã com cerca de 20 anos de idade, e lá há preconceitos religiosos contra minorias e também contra as mulheres. O ambiente [no Irã] é muito fechado”. Na UFS, a professora coordenou o curso de especialização em “Estudos para a Paz e Resolução de Conflitos”, que formou cerca de 70 estudantes em duas turmas realizadas em 2006 e 2007. Atualmente, concentra-se na publicação de seu livro: uma compilação de vários textos sobre a paz e resolução de conflitos.
Educação
A globalização e o multiculturalismo que assistimos hoje consistem em pontos importantes para se entender a tolerância. Sem este princípio, aliás, aqueles dois elementos perderiam o sentido. Ao se permitir intercâmbios culturais cada vez mais frequentes, as distinções entre o que é certo ou errado favorecem, muitas vezes, a compreensão mútua. Mas só isso não basta. O ponto a se debruçar consiste, fundamentalmente, num só: a educação. É o que acredita o professor Saulo. “O homem é intolerante por natureza. Ele não costuma ver o que é diferente com bons olhos”, diz. “É através da educação das novas gerações que esse processo pode ser revertido. Muitas pessoas já têm ideias arraigadas e por isso só as novas gerações têm potencial para mudar essa visão de mundo. A solução para a intolerância não pode ser feita a curto prazo”. O ensino de Filosofia torna-se, assim, num instrumento indispensável à sobrevivência harmônica do homem.
FONTE: Portal UFS
Dissertando sobre a negrabrasilidade literária
abril 24, 2010 às 5:46 | Publicado em Uncategorized | Deixe um comentárioTags: cultura afrobrasileira, evento, literatura brasileira
Para saber um pouco mais sobre os fundamentos da pesquisa a ser debatida no Centro de Estudos Afro-Orientais, leia o artigo Literatura negra: uma voz quilombola na literatura brasileira, da professora de literatura e renomada poeta Conceição Evaristo, texto que apresenta elementos básicos para a caracterização das vozes literárias negras que mantém um dialogismo tenso com o cânone literário brasileiro, conforme propõe Simone Santos –- clique AQUI. Para visitar o site do Pós-Afro e conhecer este ativo programa de pós-graduação em estudos étnicos e africanos, clique na imagem acima.
novos diálogos Brasil-Portugal
abril 24, 2010 às 5:18 | Publicado em Uncategorized | Deixe um comentárioTags: cultura brasileira, cultura portuguesa, televisão
"Brasil, Portugal – Lá e Cá" – programa de televisão aproxima os dois países
Co-produção das televisões públicas TV Cultura, do Brasil. e RTP2, de Portugal, o programa "Brasil, Portugal – Lá e Cá", que começa a ser exibido simultaneamente nos dois países no próximo domingo, dia 25 de Abril, é uma série de treze episódios que mostram, em ângulos ainda pouco conhecidos, o Brasil aos portugueses e Portugal aos brasileiros.
Mistura de documentário com "talk show", o programa "Lá e Cá" é apresentado pelo jornalista brasileiro Paulo Markun e pelo português Carlos Fino, Conselheiro de imprensa da Embaixada de Portugal em Brasília. Em conversas informais, eles debatem as semelhanças e as diferenças entre os dois países, fornecem informações para o telespectador compreender melhor os processos de cada país e tratam da evolução e perspectiva das relações entre o Brasil e Portugal.
A série aborda assuntos actuais e, quando necessário, resgata informações no passado, procurando sempre manter o olhar voltado para o futuro.Semelhanças e diferenças, curiosidades, subtilezas, resgate histórico e cultural entre dois países tão distantes e, ao mesmo tempo, tão próximos.
"Lá e Cá" tem como cenários de partida a casa de Paulo Markun, em Florianópolis, capital do Estado de Santa Catarina, no bairro Santo António de Lisboa, de influência açoriana, e a de Carlos Fino, em Fronteira, no Alto Alentejo, em Portugal.
A partir daí, as reportagens abrem para todo o Brasil e todo o Portugal, com temas que vão da Cultura à História, passando pela Economia e a Emigração, num variado leque de assuntos que interessam tanto a portugueses como a brasileiros.
No primeiro episódio, depoimentos como os da cantora Fafá de Belém, do jornalista português do semanário Expresso, Nicolau Santos, da artista plástica brasileira residente em Portugal, Letícia Barreto, do cantor e e compositor brasileiro Tom Zé e da fadista luso-moçambicana Mariza trazem-nos pontos de vista individuais que contextualizam o cenário sócio-cultural luso-brasileiro.
Os episódios do "Lá e Cá", ficarão disponíveis, logo após o seu lançamento, no site www.tvcultura.com.br/laeca, com a opção de que o público envie os seus comentários e os seus próprios vídeos. Os mais criativos ficarão em destaque.
Exibições: na TV Cultura, aos Domingos, às 21h (horário de Brasília). Na RTP 2, aos Domingos, às 21h (horário de Portugal).
Acesse:
www.tvcultura.com.br/laeca
FONTE: Embaixada de Portugal – Brasília, 23.4.10
letras para download
abril 15, 2010 às 1:38 | Publicado em Uncategorized | Deixe um comentárioTags: dicas, internet, referências
A cada dia, a cada minuto que passa, amplia-se num ritmo formidável a disponibilização de informações e de saberes na rede eletrônica mundial, a famosa internet. Tão imensa e tão labiríntica, o desbravamento dessa rede exige do pesquisador um trabalho contínuo de atualização dos roteiros de busca e dos “favoritos”.
Nas prateleiras eletrônicas do blogue LETRASUSP DOWNLOADS disponibiliza-se uma diversificada biblioteca básica para os estudos literários em suas principais vertentes brasileiras e estrangeiras, além de obras importantes no campo da linguística e das interfaces desta com a literatura. Sem dúvida, vale algumas horas de pesquisa, com garantia de resultados frutuosos.
pesquisando em revistas acadêmicas
abril 11, 2010 às 16:24 | Publicado em Uncategorized | Deixe um comentárioTags: base de dados, dicas, internet, referências
A pesquisa na internet, para ser eficaz, sempre exige persistência, refinamento e muita criatividade. A diversidade dos temas atribuídos às Tríades, na LitPort 2, demanda também uma perspectiva interdisciplinar para a localização de fontes. No âmbito dos textos acadêmicos, uma fonte ainda pouco explorada pelos estudantes, apesar de sua vasta riqueza, é o PORTAL DE PERIÓDICOS DA CAPES, a partir do qual se podem acessar inúmeras revistas especializadas. Importante lembrar que nem sempre os sites dessas revistas dispõem de bons sistemas internos de busca, reclamando a leitura de sumários e índices de sucessivas edições, mais ou menos como folheamos livros numa biblioteca “de papel”. Outras dicas para a pesquisa podem ser obtidos no site DIA-A-DIA @DUCAÇÃO, da Secretaria de Educação do Paraná, clicando-se AQUI ou na imagem acima.
Aliás: já experimentou digitar no Google “pesquisar na internet” para ver o que aparece?
escrita, oralidade, imagem e inteligência: quem dá mais?
abril 6, 2010 às 14:38 | Publicado em Uncategorized | 1 ComentárioTags: cultura audiovisual, educação, escrita, leitura, oralidade
Alguns leitores do site da agência de notícias Carta Maior, de onde foi transcrito o artigo abaixo, posicionaram-se criticamente em relação às considerações de Luís Carlos Lopes sobre a maneira como a falta de hábitos de leitura entre os brasileiros, principalmente os mais jovens, estaria gerando um vazio intelectual nas pessoas e empobrecendo-lhes a criatividade. E você, o que acha dessas questões?
Língua, conhecimento e crítica
Com exceção das elites mais cultas e politizadas, os jovens que já ‘estudaram’ em escolas fortemente atingidas pela força dos meios de comunicação do tempo presente tendem a pensar o mundo com muitas imagens e poucas letras, pior ainda, com pouquíssimas idéias.
Luís Carlos Lopes, Carta Maior, 24/03/2010
Volta e meia aparecem nas mídias os erros crassos de alunos nos vestibulares. Normalmente, eles são coletados nas redações e se referem ao uso da língua e ao domínio de conhecimentos básicos e especializados. A chacota e a estupefação substituem um exame mais sério do problema. Ora, eles deveriam saber, se não sabem é porque são “burros”, isto é, incapazes de aprender, tal como animais! Este modo de ver e comunicar o que ocorre, encontrável em múltiplas fontes, é levado ao paroxismo e serve de explicação absolutamente falsa, derivada de preconceitos típicos visíveis na sociedade brasileira. As redações geniais e os textos sem erros apreciáveis jamais são midiatizados. Um desavisado pode imaginar que todos os estudantes sofrem da mesma dificuldade, o que é um absurdo lógico. Espetaculariza-se o erro, talvez, para esconder os acertos.
A fala de políticos oriundos das camadas populares é objeto do mesmo tratamento. Seus erros de concordância, de acordo com a norma culta da língua, são muito freqüentes e servem para armar os que odeiam os pobres e não fazem qualquer esforço para compreendê-los. A imprecisão vocabular, o uso de comparações estapafúrdias e conceitos inadequados são tratados como sinônimo de incapacidade e de falta de inteligência. Se alguém não sabe se comunicar, tal como a elite branca e letrada, também não saberá governar! Isto significaria uma tragédia para o país. Curiosamente, é comum que os acusadores sejam portadores dos mesmos problemas dos acusados. Repetem como papagaios o que ouviram em algum espaço social ou nas mídias, reafirmando práticas odiosas de discriminação racial e social. Esquecem que já viveram situações onde os governantes eram letrados e se diziam poliglotas e nada disso impediu a corrupção e a tomada de medidas contra os trabalhadores.
O fato de ser formalmente letrado não exclui a possibilidade de ‘errar’ no português culto e muito pior do que isto demonstrar incrível incapacidade de compreensão de rudimentos básicos das ciências e das artes eruditas e populares. O porte de diplomas pode ser uma arma de distinção, usada para a ascensão social e para a manutenção de empregos e de privilégios. Entretanto, isto não garante o domínio da norma culta da língua e nem mesmo do conhecimento especializado que é objeto da diplomação. Não são poucos os falantes do ‘javanês’ completamente e corretamente portadores das láureas formais dos canudos de papel. É possível chegar ao grau máximo – o doutorado – sem que se tenha um grau mínimo de verdadeiro saber. Sem deixar de lembrar, que o conhecimento acadêmico jamais substituirá àquele vivenciado por cada um, o que os distingue do ponto de vista humano, para o bem e para o mal. Nenhuma academia pode garantir a humanidade positiva de cada um de seus alunos.
Obviamente, não há santidade no desconhecimento lingüístico e na ignorância técnica, científica e artística. Na política, ninguém é santo por pouco saber. Todavia, muito pior do que a inexistência do domínio dos elementos básicos do conhecimento acumulado pela humanidade é o ato de vendê-la aos interesses do capital. Uma frase capenga com erros de construção gramatical consiste em um erro social praticado por um indivíduo que teve problemas para estudar desde sua infância. Trata-se de um problema político, contra o qual não se devem medir esforços para impedir que se repita melancolicamente no mesmo país. O que dizer dos que estudaram, dos doutores que se omitem, dos que se calam frente a qualquer iniqüidade, dos que aceitam a guerra, a fome e a miséria como fatos naturais e inelutáveis, dos corruptos diplomados na ladroagem oficial e oficiosa.
A simples leitura dos comentários dos leitores das grandes mídias indica, em profusão, a existência do mesmo problema. Na era da Internet, surgiram novas formas de comunicação escrita usadas por anônimos que adoram comentar o que lêem e, mais ainda, o que vêem, na forma de imagens fixas e em movimento. Há uma forte vontade pública de se dizer o que se pensa, mesmo que o espaço seja pequeno e a prosa seja igualmente limitada. Os leitores superaram o espaço das antigas cartas mandadas para os jornais. Eles participam em uma espécie de fórum eletrônico, onde comentam o que outros escreveram. Nas mídias de menor alcance social, como nesta onde escrevo, a tendência é a de existir um maior cuidado. Todavia, os mesmos problemas também se repetem.
Em vários programas e sítios ditos de ‘relacionamento social’, podem-se captar tendências formais de uso da língua e domínio de conteúdo especializado ou de amplo interesse público escritos do mesmo modo de sempre. Obviamente, que existem inúmeras variações e exceções. Parte-se do princípio que são os jovens os seus principais usuários, certamente, isto não é inteiramente verdadeiro. É difícil mensurar com maior precisão as faixas etárias, a origem, posição social e o local de acesso dos envolvidos. Aparentemente, esta forma de comunicação é usada principalmente pelo público adolescente e por pessoas com menos de trinta anos. Entretanto, o acesso é possível a qualquer um que possa usar um computador no sentido de tempo e de meios materiais disponíveis.
As dificuldades hegemônicas de uso da língua e de domínio dos demais conhecimentos humanos consistem em um problema político a ser enfrentado. A melhoria do nível geral de acesso ao saber possibilitaria a construção de pessoas mais dificilmente domesticáveis e, conseqüentemente, mais aptas para a construção de uma verdadeira cidadania. Em todo o mundo, quem foi capaz de ampliar e diversificar a instrução das multidões foi o sistema público de ensino. Sem ele, fica difícil imaginar que a educação seja algo além do que uma simples mercadoria ou um simulacro do verdadeiro saber. O problema é que a educação isoladamente não faz milagres. Não adianta, ter escolas com salários de fome para seus professores e com alunos que vivem em condições precárias de vida que os impossibilitam aprender. Uma política educacional, para não ser demagógica, deve considerar todos os problemas que enfrentam os entes que dela participam.
No Brasil contemporâneo, atingiu-se ao que alguns críticos chamam de videoesfera, isto é, o predomínio de uma comunicação feita por meio de imagens, inclusive as relativas às palavras, produzidas, ouvidas e lidas nos artefatos do tempo presente. A chegada a esta era foi muito rápida, tendo atropelado a escala, vivida em outros países, da grafoesfera. Passou-se para a imagem, sem se ter bem vivenciado a palavra escrita, sempre reduzida a pequenos círculos sociais. Um dos sintomas disto é o fato de haver no país a publicação anual de centenas de livros, em sua maioria, em pequenas edições, muitas vezes, alcançando não mais do que 1000 exemplares. O número dos que escrevem vem se aproximando velozmente da quantidade real de leitores. Estes, em muitos casos, jamais conheceram o livro, como objeto essencial de suas vidas. Os livros que mais vendem são os escritos por personas midiáticas e/ou os que forem amplamente publicizados nas grandes mídias, vendidos como se fossem pastas de dente ou sabonetes. Não importa a qualidade do produto e, sim, a publicidade e a sintonia com as modas e outras ligações com o espírito de época.
A era da videoesfera reforçou a velha oralidade, onde quase tudo é resolvido por meio da fala, com uma intervenção mínima da palavra escrita. Por isso, a escrita reaproximou-se da fala. Neste cenário, não é difícil compreender a inexistência de qualquer respeito à norma culta da língua. Aliás, esta é um problema porque impede qualquer modernização simplificadora que capture mais leitores e escritores. Foi construída para uma pequena minoria, desconsiderando a necessidade de se instruir às maiorias. O mesmo mecanismo permite compreender o recuo, fortemente preconceituoso, à tradição e aos sensos comuns primários que se postam contra qualquer conhecimento técnico, científico e artístico mais complexo.
Os jovens são muito afetados por todo este processo, porque já ‘estudaram’ em escolas que foram fortemente atingidas pela força dos meios de comunicação do tempo presente. Com exceção das elites mais cultas e politizadas, eles tendem a pensar o mundo com muitas imagens e poucas letras, pior ainda, com pouquíssimas idéias.
Luís Carlos Lopes é professor e autor do livro "Tv, poder e substância: a espiral da intriga", dentre outros.
o Brasil como nação luso-africana: sincretismos & assimetrias
abril 4, 2010 às 1:01 | Publicado em Uncategorized | Deixe um comentárioTags: cultura afrobrasileira, cultura portuguesa, herança colonial, identidade, luso-tropicalismo, mestiçagem, racismo
As versões tradicionais acerca da formação identitária brasileira tendem a realçar o protagonismo dos portugueses e a posição hegemônica alcançada pela cultura desse povo durante o período colonial, a qual acaba por se sobrepor aos valores das diversas sociedades indígenas nativas do território, definindo assim uma matriz ibérica, ou lusitana, para a cultura brasileira, matriz cujas principais e duradouras influências se manifestam na língua, na religião e nos modelos políticos que organizam a sociedade. Apesar da atitude “amnésica” que a maioria dos brasileiros mantém com relação às heranças lusitanas, elas de fato são bastante profundas, sendo interessante, ou perturbante, observar como essas heranças foram abrasileiradas e são hoje imaginadas como invenção original nossa. Dê um salto no MUJIMBO e confira alguns elementos básicos da cultura portuguesa, procurando refletir sobre a maneira como esses elementos se reinserem e são ressignificados nas práticas e ideários do povo brasileiro.
A realidade, entretanto, sempre foi mais complexa, ou mais sincrética, do que as definições oficiais acerca da história cultural do Brasil. Desde os primeiros momentos da construção colonial, também constitui-se uma matriz africana para a futura brasilidade, forjada pelos aportes diversificados de saberes, artes, linguagens e sentimentos trazidos pelos milhões de africanos para cá transplantados à força, e que aqui se refazem identitariamente, entrecruzando seus referentes aos europeus e ameríndios. No ensaio “O colono preto como fator da civilização brasileira”, trabalho pioneiro do pesquisador baiano Manoel Querino, começa-se o desmonte dos esforços da historiografia oficial para apagar o papel do negro africano como co-colonizador do Brasil, abrindo caminhos que encontrarão uma decisiva síntese intelectual e ideológica no livro Casa-grande & senzala, de Gilberto Freyre, obra que pode ser considerada como um texto fundador do imaginário moderno sobre a mestiçagem afro-luso-brasileira. Persiste nela, entretanto, uma perspectiva domesticadora para o valor das heranças africanas, tidas como complementares às matrizes portuguesas, e de restritas funções civilizacionais.
A partir do discurso luso-tropicalista freyriano, consolidou-se uma imagem identitária brasileira na qual os elementos culturais africanos adquirem positividade na medida em que se restrinjam a influenciar apenas alguns setores da vida, tais como as relações sentimentais e sexuais, o misticismo religioso, os costumes cotidianos e as artes e festas populares. Em sua dimensão sociológica, esse sistema possibilita aos sujeitos afrodescendentes integrarem-se aparentemente sem discriminação, e mesmo usufruindo de altos graus de intimidade em seus convívios com os sujeitos europeizados, desde que não contestem a hierarquia civilizacional vigente e reproduzam os “bons” estereótipos, como o do negro trabalhador e humilde, da mulata sensual e “alisada”, da criada devotada e submissa, do “negão” companheiro e esportista. Essas formas parciais e simbólicas de integração, no entanto, não impediram que gravíssimas assimetrias sócio-econômicas se instalassem entre os segmentos mais claros e mais escuros da população brasileira, conforme repetidas pesquisas têm demonstrado, apontando mesmo para diferenças entre a qualidade de vida desses grupos mais acentuadas do que as produzidas por sistemas discriminatórios explícitos, como o apartheid sul-africano.
Esse complexo processo transculturador, ou hibridizante, foi às vezes metaforizado como um “cadinho de raças”, do qual resultou, por uma espécie de fusão bio-cultural, o tipo que chamamos de “moreno”, tido como correspondente à manifestação mais completa, ou harmônica, ou objetiva do sujeito brasileiro. Nas interações sociais efetivas, contudo, a morenidade representa um tipo de “brancura tropical”, cujos modelos estéticos, psicológicos e culturais estruturam-se de acordo com padrões eurocêntricos, dinâmica simbólica que termina por naturalizar as situações de exclusão, de sub-cidadania e de super-exposição à violência que afligem à população afrodescendente.
Entre a assimilação controlada e a purgação desejável, as imagens da africanidade e da negrura encontram-se quase sempre rasuradas ou marcadas por conotações negativas, primitivistas e animalizantes, como discute a professora e pesquisadora de literatura afro-brasileira Maria Nazareth Fonseca em um dos seus ensaios. Quais relações podem ser estabelecidas entre as formas de negociação das heranças africanas no imaginário brasileiro e o conceito de “imaginação do centro” proposto por Margarida Calafate Ribeiro para a discussão dos processos configuradores da identidade portuguesa?
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